O novo embaixador e o isolamento internacional do governo israelense

Israel é um país geograficamente pequeno. Sua área, de vinte e dois mil quilômetros quadrados, é próxima da área de Sergipe, o menor estado brasileiro. Um país pequeno incrustado em uma região instável, com relações complicadas com seus vizinhos, por razões étnicas, religiosas e políticas. Isso faz com que suas relações exteriores sejam essenciais para o país, não apenas para sua política e sua economia, mas também para sua existência. Em que pese a história bélica do país e seus conflitos, Israel possui um retrospecto positivo na construção de suas relações, justamente pela ciência da importância do tema. Uma lição que, aparentemente, não foi ensinada ao atual Primeiro-ministro. Nos últimos anos, o premiê Benjamin Netanyahu está constantemente deteriorando as relações de seu país.

O caso mais gritante foi o de total isolamento israelense nas negociações do acordo nuclear entre o Irã e as potências Ocidentais, tratado em diversos textos aqui no Xadrez Verbal. Netanyahu teve postura intransigente e agressiva. Seria compreensível ele não querer transmitir a ideia de que é o melhor amigo de um vizinho com péssimas relações e discursos ainda mais agressivos, mas era imperativo, pragmaticamente, manter seu país em negociações essenciais para a geopolítica da região. Com seus pronunciamentos, como o feito na Assembleia Geral da ONU em 2014 com um cartaz de uma bomba caricata, conseguiu apenas isolar Israel.

Mais ainda, conseguiu prejudicar as relações de Israel com seu principal aliado, os EUA. O país americano foi essencial, como dito na introdução, para até a existência de Israel, incluindo fornecimento de armamento emergencial durante a Guerra do Yom Kippur, em 1973, quando Israel estava em desvantagem após ser atacado por seus vizinhos árabes. Israel esteve presente de forma implícita no discurso de Obama após o anúncio do acordo nuclear. Netanyahu entrou em confronto direto com a Casa Branca ao ir, sem convite do Executivo, ao Congresso dos EUA, de maioria republicana, para pedir que o Legislativo trave qualquer acordo. O discurso de Netanyahu foi boicotado por políticos democratas e condenado por Nancy Pelosa, líder do partido no Congresso. Isaac Herzog, líder da oposição em Israel, declarou que o país não teve nenhuma influência em Viena por culpa de Netanyahu, que deteriorou as relações exteriores do país.

As relações entre Israel e a Europa sofrem constante desgaste desde a década passada, especialmente devido ao crescente reconhecimento da demanda palestina por um Estado soberano. Protesto formal contra a Suécia, o primeiro país que reconhece o Estado da Palestina enquanto membro da União Europeia. Repetidos choques com a UE, em temas como o muro na Palestina e o repasse de recursos para regiões palestinas. Até com a Santa Sé houve tensão, pelo reconhecimento do Estado da Palestina pelo Papa Francisco. A colonização em território palestino ocupada também foi tema de críticas por parte do Secretário-geral da ONU.

Em 2014, com a escalada de hostilidades em Gaza, tivemos condenação internacional das ações israelenses. Foi quando o Brasil convocou seu embaixador em Israel, causando a declaração de um porta-voz israelense de que o Brasil seria “anão diplomático”; o assunto e a sua repercussão também foram temas de textos no Xadrez Verbal. E, agora, as relações Brasil-Israel voltam ao centro da discussão. Após apontar um moderado, Reda Mansour, da etnia drusa, para o cargo de embaixador de Israel no Brasil, Israel trocará seu representante no Brasil; oficialmente, Mansour retornará ao seu país por razões particulares. O indicado como substituto foi Dani Dayan, político conservador e exclusivista sobre os territórios da Palestina, defendendo a colonização de áreas ocupadas.

Essa perspectiva vai totalmente contra a postura amplamente defendida pelo Brasil, de dois Estados para dois povos, com uma divisão territorial baseada nas fronteiras de 1967, antes da Guerra dos Seis Dias. A indicação de um político, não diplomata, ligado de forma radical aos temas sensíveis citados seria ou falta de tato, ou provocação. Sendo que o Brasil é, independente de tensões recentes, o principal parceiro de Israel na América Latina. O Brasil foi essencial no estabelecimento de Israel em 1947, quando a AGNU foi presidida por Oswaldo Aranha. Uma das dez maiores populações judias do mundo fora de Israel está no Brasil, que também é o maior parceiro comercial de Israel na região, possuindo um tratado de livre-comércio (um dos poucos do MERCOSUL) e volumosos acordos de comércio de armamento.

Por pressões políticas internas ao Brasil e ao cenário político israelense, o Brasil, em canais extraoficiais, rejeitou a indicação, que já tinha aprovada pelo Knesset, o parlamento de Israel. No Brasil, a pressão era pela óbvia contradição das posições políticas do indicado. Em Israel, a pressão é múltipla. Políticos da base governista defendem a indicação e acham que o governo Netanyahu deveria insistir no tema; segundo a Folha de S. Paulo, o governo israelense busca uma conversa direta com Dilma Rousseff. Já políticos da oposição defendem a manutenção do indicado, não por concordarem com sua política, mas por criticarem a interferência de “movimentos de esquerda” na política israelense, temendo perder espaço no papel de oposição. Já os críticos da indicação possuem dois motivos.

Setores que defendem a negociação com os palestinos criticam Dani Dayan por suas posições radicais, os citados “movimentos de esquerda” pela oposição parlamentar. Também ex-diplomatas criticam Netanyahu por fazer uma indicação política para um cargo de visibilidade. A crítica é perene; o governo israelense estaria usando indicações de embaixada como barganha política. De fato, desde maio de 2015 Netanyahu acumula os cargos de Premiê e de Ministro das Relações Exteriores. Embora não seja algo inédito, é a terceira vez que Netanyahu faz isso em sua carreira, porém, com uma diferença no atual momento. Um loteamento do ministério sem precedentes, com seis políticos com funções diplomáticas, inclusive a vice-ministra de Interior, ultranacionalista e exclusivista. Netanyahu, hoje, está isolado domesticamente, onde sua coligação partidária possui o mínimo de assentos no Knesset. E também está isolando, cada vez mais, Israel no cenário internacional.


assinaturaFilipe Figueiredo, 29 anos, é tradutor, estudante, leciona e (ir)responsável pelo Xadrez Verbal. Graduado em História pela Universidade de São Paulo, sem a pretensão de se rotular como historiador. Interessado em política, atualidades, esportes, comida, música e Batman.


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