Xadrez Dominical (17) – Itália e a guerra
Caros leitores
No dia 10 de Outubro, como avisei no perfil do Xadrez Verbal no Facebook (caso ainda não siga o blog no Facebook, corrija isso agora), celebrou-se o bicentenário de nascimento de Giuseppe Verdi, e era essa a minha ideia para o Xadrez Dominical de hoje; porém, no dia 11 de Outubro, morreu Erich Priebke, aos cem anos, de causas naturais. Uma morte que não deve ter sido muito lamentada, vide que era um criminoso, um covarde e um fugitivo da justiça. Esse fato, somado ao aniversário de 70 anos, celebrado hoje, da divisão da Itália durante a Segunda Guerra, em que parte do país repudia o fascismo e a aliança com a Alemanha e passa a combater ao lado dos Aliados, fez com que o tema do Xadrez Dominical de hoje seja Itália e a guerra.
Retomando, quem foi Erich Priebke? Pouparei o leitor dos adjetivos apropriados, já que não é exatamente o tom deste espaço. Criminoso de guerra condenado, fez parte da polícia da SS e foi um dos responsáveis pelo massacre das Fossas Ardeatinas, em Março de 1944, ordenado em retaliação à uma bomba detonada por partisanos nas ruas de Roma, que matou 33 soldados alemães; o massacre tirou a vida de 335 civis, executados à tiros. Depois da guerra, fugiu covardemente para a Argentina, refúgio de diversos criminosos de guerra nazistas, onde viveu por mais de cinquenta anos, teve diversos pedidos de extradição protelados por anos, e morreu confortavelmente, aos cem anos, de causas naturais, sem jamais ter demonstrado arrependimento.
Retiro a advertência feita acima. Erich Priebke foi um grande filho da puta.
O massacre das Fossas Ardeatinas é o tema do filme Massacre em Roma, cujo título original, traduzido literalmente, seria represália. Com Richard Burton e Marcello Mastroianni nos papéis principais, é um filme forte. Não é um filme de ação, de guerra. É um drama. Quase uma peça de teatro. E daqueles filmes que tem que ser assistido.
O fato de a Itália ter se dividido durante, e mesmo anteriormente, à guerra, rendeu muitos bons filmes. Fascistas radicais, favoráveis à guerra e ao Pacto de Aço, de um lado; nacionalistas contrários à guerra no meio; comunistas antifascistas do outro. A posterior ocupação alemã no norte, e um novo governo italiano que se junta aos Aliados, colocando o país praticamente em guerra civil. Além disso, a Itália teve uma colaboração dúbia no Holocausto, muitas vezes resistindo às diretrizes alemãs de perseguição aos judeus.
Talvez o mais conhecido, e comovente, seja A Vida é Bela, de Roberto Benigni, que ganhou os Oscar de Melhor Ator (para um trabalho que não era em inglês, diga-se), Melhor Trilha Sonora e Melhor Filme Estrangeiro. Um judeu e seu filho são enviados para um campo de concentração, e o pai, interpretado por Benigni, usa a imaginação e inventa situações para “disfarçar” os horrores da situação para seu filho pequeno.
A Trégua, de 1997, conta a história de Primo Levi, um dos mais conhecidos sobreviventes de campos de concentração, em sua jornada de Auschwitz de volta para a Itália, após a guerra. Duas Mulheres, de 1960, foi o filme que sedimentou a carreira de Sophia Loren como “não só um rostinho bonito”, rendendo a ela um Oscar de Melhor Atriz, na primeira vez que o prêmio foi para uma atuação em língua não inglesa. É um filme pesado, sobre uma mãe e sua filha, vítimas de abusos, no meio da guerra. Mediterraneo é um filme de 1991, que venceu o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Eu assisti esse filme quando ele foi lançado em uma coleção da Folha, que meu pai assinava, em VHS. O filme conta a história de um grupo de soldados italianos que foram deixados para trás em uma ilha grega, e cada um dos soldados tem uma personalidade e ideologia diferente, numa alegoria da mistureba que eu citei alguns parágrafos acima. É uma mistura de drama com romance com comédia, um bom filme para uma tarde de domingo.
Finalmente, um filme não italiano. Milagre em Sta. Anna, de Spike Lee, é um filme focado em um grupo de soldados afro-americanos, e faz diversas analogias sobre questões de direitos civis nos EUA. Mas também retrata diversos aspectos da sociedade italiana na guerra, como os partisanos e massacres cometidos pela ocupação alemã. É um filme longo, que às vezes cai no aborrecimento, mas ainda é um bom filme. Finalmente, um filme produzido durante a guerra. Roma, Cidade Aberta, de 1945, de Roberto Rossellini, talvez seja sua maior obra. O filme se passa durante a ocupação de Roma pelos alemães, em 1944, e recebeu o Grande Prêmio do Festival de Cannes.
Para uma indicação de leitura, volto ao personagem que originou esse post, a Argentina foi refúgio para diversos criminosos nazistas. O mais famoso, tanto por seu alto posto na hierarquia, quanto por seu destino, talvez seja Adolf Eichmann, um dos principais arquitetos do Holocausto. Ao descobrirem seu paradeiro, em 1960, agentes do Mossad, o serviço secreto israelense, o capturaram, o enfiaram dentro de uma mala, colocaram-no dentro de um avião (tudo isso é literal, viu) e o “contrabandearam” pra Israel, onde foi julgado, condenado e enforcado. O julgamento, sua cobertura jornalística e conversas com psicólogos que acompanhavam o caso renderam a seminal obra Eichmann em Jerusalém – Um relato sobre a banalidade do mal, de Hannah Arendt, em que ela trata de diversos aspectos pessoais e ideológicos. Não é uma leitura pesada, ao contrário dos outros livros da autora, e vale a pena.
Além disso, você pode visitar o post com algumas dicas sobre a participação brasileira na Segunda Guerra, já que boa parte dessa participação foi na Itália. E, claro, tem mais dicas? Gostou, não gostou? Comente aí!
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Tem um filme recente sobre a Hanna Arendt no período do julgamento de Eichmann, interessante também.
Caro Luis, bem lembrado, boa dica. Infelizmente ainda não tive tempo de assistir. Um abraço.
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