Política, partidarismo e politicagem
No dia quinze de Junho de 2013, o governador do estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, afirmou que os recorrentes protestos na capital, contra o aumento da tarifa do ônibus (mas não restritos à apenas ao aumento), tinham “duas marcas”: serem políticos e violentos. Sobre serem, ou não, violentos, não será discutido aqui, neste post. Mas, seriam os atos políticos? É claro que são. Para contextualizar o termo, uma breve introdução. Política deriva do grego pólis, termo originalmente usado em referencia às cidades-estado da Grécia clássica, mas que podem indicar qualquer forma de organização social. De pólis, no grego, provém polítikos (os cidadãos, como eu e você, não apenas o governador) e politéia (assuntos relativos à pólis, no caso, à São Paulo). Ou seja, basicamente, todo e qualquer tema, ato, procedimento, postura, etc, referente à nossa vida civil e coletiva é um ato político. Agora que o autor já fez pose de intelectual, vamos discutir a fala do governador.
Apertar os botões da urna eletrônica a cada dois anos, é um ato político. Vaiar a presidenta num estádio de futebol é um ato político. Seus pais tirarem sua certidão de nascimento foi um ato político. Você querer que a urna eletrônica, a presidenta, o futebol e a certidão de nascimento se explodam, é um ato político. Até funções biológicas podem ter conotação política, como se alimentar. O que seria então uma greve de fome em protesto contra uma ditadura, por exemplo?
O meu ponto é: o governador está errado ao caracterizar uma manifestação como “política” em um tom pejorativo, como se isso significasse uma característica negativa, a ponto de estar ao lado do termo “violência”. Na verdade, é exatamente o contrário. Milhares de pessoas às ruas, nas ruas de sua cidade, é a essência da política. Um dos atos mais políticos, num sentido elogioso, é ver milhares de cidadãos querendo a melhoria de sua pólis.
Outro termo que está nesse contexto é partidário. Um ato partidário ainda é um ato político, mas não necessariamente restrito à coletividade ou aos cidadãos, mas que também acorda com um, ou vários, partidos políticos. Em um primeiro momento, não há nada de ruim nisso. Infelizmente, no Brasil contemporâneo, os partidos políticos tomaram propriedades etéreas, como se organizações desconectadas do cidadão “comum”, da realidade. Em bom português, seriam todos uns filhos da…é, você entendeu. Aí reside o problema. Numa democracia moderna e participativa, como nossa sociedade deveria ser (mas não é), o partido político está diretamente atrelado à sociedade e seus diversos segmentos. Partidos, no plural, fortes, significam uma democracia forte. Por outro lado, atos partidários podem seguir interesses particulares, contrários à pólis. Tradicionalmente, serem “mera oposição”. Se o outro partido fez, vamos ser do contra, apenas por ser. Nesse contexto, se Alckmin tivesse usado o termo “partidário”, pejorativamente, seria mais compreensível. (observação: para o próximo ato contra as passagens do ônibus, há uma votação sobre bandeiras partidárias. Mais de cinco mil votaram contra bandeiras partidárias. Trezentos votaram a favor.).
Citei interesses particulares, talvez escusos, anteriormente, ao me referir à atos partidários. Existe outra categoria, essa sim, sempre suspeita. A politicagem. O que seria politicagem? Travestir de política o que é interesse pessoal, troca de favores, uma pequenez de pensamento. Empresários de determinado ramo financiam uma campanha política, por exemplo. Ao ser eleito, o tal político contrata, sem licitação, os empresários anteriormente citados, com cifras irreais. Nem precisamos ir tão longe. Um cargo para um parente, um ingresso de futebol para um possível eleitor, uma troca de votos. Deputado Fulano, do partido X, vota pelo partido Y. Posteriormente, o partido Y “orienta” sua bancada para votar favoravelmente à proposta do Fulano. Os interesses dos eleitores dos partidos? Do que se trata a proposta? Quais ideias Fulano defendia? Não importam. Uma mão lava a outra e ambas continuam sujas.
Ao escrever esse texto, estou fazendo um ato político. Você, ao ler, também. “O homem é um animal político”, como disse Aristóteles (última dose de pose de intelectual, prometo). Ao aderir aos atos contra o aumento do ônibus (e não restritos ao aumento do ônibus, novamente), você está, politicamente, aderindo um ato político. Ao não aderir, também. Ao condenar, também! Tudo que influencia sua cidadania, e tudo que você faz para influenciar a cidadania do outro, é político. Isso não quer dizer que você precisa usar terno, chamar os outros de “vossa excelência” e beijar bebês na frente dos fotógrafos. Você não precisa seguir nenhum protocolo, ser você mesmo já é suficiente. Então, sim, governador, os atos dos últimos dias em São Paulo foram sim políticos. Assim como sua declaração.
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No cerne da questão este último texto.Como diz nossa Carta Magna em seu Art. 1º parágrafo ùnico “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos diretamente, nos termos desta constituição.” Sendo assim o detentor do Poder Legitimo é o povo e não seus representados, ah seu Governador de SP uma aula de Direito Constitucional lhe cairia bem!
Aulas de direito constitucional caem bem para todos os cidadãos. Um abraço
É que os políticos brasileiros estão tão acostumados a empregar o termo “política” e utilizá-la na prática tão mal, tão e somente para alcançarem seus objetivos mesquinhos e desonestos. Já desvirtuaram-na tanto, que nem eles mesmos sabem ao certo o que estão dizendo.
O termo “política”, ganha tons pejorativos na boca dessa gente.
Caro Hack, cabe ao restante “limpar” a política, inclusive o termo. Um abraço!
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