Síria: A resposta de Putin para Obama

Caros leitores,

Ontem, 11 de Setembro de 2013, o jornal New York Times publicou um op-ed (um artigo que expressa a opinião do autor, que não é vinculado ao jornal; a sigla vem de “oposto ao editorial”, sendo que o editorial é a coluna em que o próprio jornal, ou editor, expressa sua opinião) escrito pelo Presidente da Federação Russa, Vladimir Putin.

Obama e Putin no encontro do G8, em Junho passado, num ótimo retrato da relação entre os dois líderes.  Foto: Reuters/Kevin Lamarque

Obama e Putin no encontro do G8, em Junho passado, num ótimo retrato da relação entre os dois líderes.
Foto: Reuters/Kevin Lamarque

Com o título de “Um apelo da Rússia por cautela”, e o subtítulo “O que Putin tem para dizer aos americanos sobre a Síria”, o artigo é uma clara resposta ao pronunciamento do Presidente dos EUA, Barack Obama, tratado ontem aqui mesmo nesse blog. Espero poder postar o artigo de Putin traduzido na íntegra; enquanto não recebo essa autorização, resumirei o artigo. Para os que quiserem ler no original em inglês (e é sempre melhor, quando possível, ler os textos em seu idioma original), acessem o link.

Traduzirei a introdução na íntegra: “Os recentes acontecimentos em torno da Síria levaram-me a falar diretamente com o povo americano e seus líderes políticos. É importante fazê-lo, em um momento de falta de comunicação entre as nossas sociedades.”

O tom está claro. Obama deu sua versão, agora Putin dará a sua.

O artigo de Putin é, em minha opinião, uma aula de realpolitik justificada com elementos do Idealismo de Woodrow Wilson, Presidente dos EUA quando da Primeira Guerra Mundial; ou seja, quando a política e a ética se justificam mutuamente, além de evento raríssimo, tornam-se um argumento muito difícil de ser refutado.  Após uma abertura em tom conciliatório, lembrando da aliança que derrotou a Alemanha nazista e que ambos os países, juntos, fundaram a Organização das Nações Unidas, Putin dá sua primeira alfinetada: lembra que o poder de veto e o Conselho de Segurança foram criados com a concordância dos EUA.

Vai além: afirma que ninguém quer que a ONU tenha o mesmo destino da Liga das Nações, mas que isso é sim possível, se o Conselho de Segurança for constantemente ignorado e ações forem tomadas sem a aprovação necessária, e tais ações seriam atos de agressão. Não sei se podemos classificar isso como uma ameaça direta, mas uma lembrança velada de que os EUA assumiram um compromisso em respeitar a posição do CSNU e, ao desrespeitar tal preceito básico, pode gerar a própria dissolução do organismo, o que seria, em curto prazo, catastrófico.

Ao comentar a Síria, Putin afirma que não se trata de uma luta por democracia, mas uma guerra entre facções em um país multirreligioso (será que ele leu meu post?). Lembra que algumas das facções da oposição, como a Al Nusra, são classificadas como terroristas pelos próprios EUA, afirma que o conflito corre risco de escalada, citando Irã, Israel e Palestina e, finalmente, que um ataque não conta com apoio popular em praticamente lugar algum, citando até mesmo o Papa como opositor da ação; curiosamente, o catolicismo é minoria nos EUA e virtualmente inexistente na Rússia.

Putin deu outras duas alfinetadas, mais incisivas, na política dos EUA. Afirmou que, além dos grupos extremistas recebem armamento estrangeiro, poderiam lançar um ataque à Israel, para legitimar uma intervenção de seus “patronos” e disse não entender o motivo de intervenções militares terem se tornado cotidianas para os EUA, algo que apenas prejudica a imagem internacional do país e reforça uma mensagem contrária ao que os EUA pretendem; não passam a mensagem da democracia, mas da força bruta, de “ou você está conosco ou está contra nós”.

Finalmente, o tom principal de toda a tese de Putin, como eu disse, uma mistura de realismo e idealismo que, embora seja certamente retórica em certas partes, forma um argumento sólido. A Rússia não estaria protegendo o governo sírio, mas a lei internacional e afirma que  uma demonstração de força de agressão poderia levar todo o sistema internacional ao caos, fragilizando os próprios propósitos do possível ataque; como advogar pelo desarmamento nuclear se os países que não possuem armamento de destruição em massa são agredidos? Logo, todos os países correriam para ter suas bombas atômicas. A cooperação com a Síria, que já deu diversos sinais de disposição, causaria uma melhora na comunidade internacional e abriria portas para outras soluções importantes.

O parágrafo de conclusão eu também traduzirei na íntegra: “Minha relação de trabalho e pessoal com o presidente Obama é marcada pela crescente confiança. Eu aprecio isso. Eu cuidadosamente estudei seu discurso à nação na terça-feira. E eu preciso discordar com um ponto que ele fez no excepcionalismo americano, afirmando que a política dos Estados Unidos é “o que torna a América diferente. É o que nos torna excepcionais.” É extremamente perigoso encorajar as pessoas a perceberem-se como excepcionais, seja qual for a motivação. Há países grandes e países pequenos, ricos e pobres, aqueles com longa tradição democrática e aqueles ainda procurando o seu caminho para a democracia. Suas políticas são diferentes, também. Somos todos diferentes, mas quando pedimos as bênçãos do Senhor, não devemos nos esquecer que Deus nos criou iguais.”

Usando o mote do nome do blog: Putin colocou Obama em xeque.

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Um amigo chamou a atenção para um dos comentários feito por leitores, na página do texto. Putin tem, para esse blogueiro, como maior falha recente, suas leis homofóbicas. Aproveitando da frase escrita por Putin como resposta ao tradicional “Deus abençoe a América” de Obama, “não devemos nos esquecer que Deus nos criou iguais.”, uma leitora comentou: Os gays também são iguais, Putin.

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